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My Friend Pedro | Review: Casual tentando ser profundo

Para My Friend Pedro, ser “gente grande”, ser reconhecido pela indústria de jogos significa fazer de tudo um pouco.

My Friend Pedro | Review - Casual tentando ser profundo
My Friend Pedro | Review

Muitas vezes, quando comentamos de jogos, temos a tendência a referir a certos momentos deles como “ritmos”, ou “batidas”. E é importante entender isso para descobrir as principais falhas de My Friend Pedro (Steam / Nintendo Switch) da Deadtoast.

Estes podem ser definidos através de como ele se apresenta, o ponto de cume – onde a história chega ao ápice após longas horas de interações entre os personagens e momentos de tensão, ou até mesmo de fases; a forma que tais fases se apresentam, como é navegar por elas, a disposição de elementos como plataformas ou inimigos.

Manter essa batida, esse ritmo, quase constante é a diferença entre um excelentíssimo jogo e um jogo descompassado.

A História de My Friend Pedro começa muito antes de você apertar o botão play, ela se estende para mais de 5 anos atrás no NewGrounds – site que em meados dos anos 2000 foi um caldeirão borbulhante de ideias e experimentos (recomendo o vídeo ensaio de Alexandra Orlando sobre alguns jogos peculiares e até com teor sexual que existiam no site).

My Friend Pedro originalmente era distribuído pela Adult Swim Games como um simplíssimo jogo em flash. Você completava algumas fases, podia usar uma habilidade para desacelerar o tempo, e de quebra pegava uns efeitos bem legais.

Simples, essa era a pegada do jogo na época. Algo que você abria no seu navegador, jogava por alguns minutos e depois deixava de lado. Às vezes, quem sabe, voltava para jogar um pouco mais.

Já tinha deixado um pouco de lado o Newgrounds para partir para outros “vícios”, na época Winterbells. Desenvolvido pela Orisinal, ele era tão simples quanto a versão original de My Friend Pedro.

Você controlava um coelho que tinha que pular de sino em sino, e quanto mais alto você chegava, menor os sinos ficavam, e maior a sua pontuação.

Se você acompanha o meu trabalho e conhece a minha paixão por games como Nex Machina, já sabe que eu e a eterna tentativa de fazer a pontuação máxima em um jogo andamos de mãos dadas.

Chegou em um ponto que eu e uma amiga competíamos pela melhor pontuação compartilhando fotos da tela de nossos computadores por meio do finado MSN Messenger.

Anos depois vi que uma versão para iOS (agora depreciada, já que o mercado mobile é ainda mais volátil que a indústria de jogos para PC / consoles e carece de uma retrocompatibilidade competente) foi lançada. Imediatamente comprei, mas joguei pouquíssimas vezes.

My Friend Pedro | Review
As fases iniciais de My Friend Pedro lembram bastante o jogo original…

Não existia uma grande diferença entre as versões; era o mesmo Winterbells que eu amei por tantos anos, mas a mensagem havia mudado. Para mim a Orisinal dizia: “Isso aqui é uma distração, não é para você gastar horas fazendo a pontuação mais alta. Jogue por alguns minutos, jogue na fila do banco, jogue em qualquer lugar, mas não dê muita atenção”.

Isso me frustrou pois até aquele momento Winterbells era competitivo, hipnotizante; não queria que se tornasse uma mera distração.

Quando eu finalizei My Friend Pedro eu senti a sensação contrária à que tive com Winterbells; eu estava exausto mesmo ele durando apenas três horas.

Estava exausto do tiroteio, das piadas sem graça, de tentar injetar “personalidade” nos personagens e na quase inexistente história.

O início de My Friend Pedro muito me lembra o próprio jogo original: foco em estilo, eliminar os oponentes de maneiras absurdas para aumentar a sua pontuação, terminar os níveis o mais rápido possível, simplesmente se divertir com todo o exagero que existe em volta dele.

Se você estendesse isso por mais uma hora, duas horas até (que é exatamente o que o jogo faz) eu mais do que me daria por satisfeito. Teria até um bônus se um modo arena fosse desbloqueado para eu testar as minhas habilidades.

Mas, não, My Friend Pedro segue o caminho contrário.

À medida em que as fases avançam, My Friend Pedro deixa de ser menos sobre ação e mais sobre ação misturada com longos elementos de plataforma; assim, se você não for perspicaz e descobrir o caminho correto no instante que você chegar no mapa, perde o multiplicador de pontuação.

Isso seria uma crítica dura se não fosse o fato de que bem, o multiplicador está justamente para eu me sentir investido a experimentar novas táticas e / ou maneiras de eliminar os meus inimigos, e assim descobrir qual era a que aumentava mais a minha pontuação.

Eu não estava lá para decifrar um mini-puzzle onde você tem que atirar em um switch para ativar uma plataforma, pular e depois atirar em outro. É essa a quebra de ritmo que eu falei no começo do texto, e ela só tende a aumentar quanto mais eu avançava na “história”.

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…mas rapidamente começam a ganhar “mecânicas” desnecessárias…

Houve momentos que eu comecei a questionar se My Friend Pedro queria ser um jogo de plataforma com shooter ou um shooter com elementos de plataforma, especialmente durante uma seção bastante psicodélica onde, após pular de uma plataforma, ela irá desaparecer em instantes.

Me senti de volta aos anos 2000 nas (terríveis) fases de pesadelo de Max Payne.

Ao menos aquelas serviam para avançar a história, demonstrar um pano de fundo de trauma e de culpa de Max. Não há história suficiente em My Friend Pedro para sequer justificar essa mudança drástica.

Me sentia restringido, queria me interessar — interagir — mais com o jogo, mas era constantemente interrompido por alguma plataforma, algum chefão com o mesmo padrão de ataque ou com alguma “gimmick”, como acertar pontos fracos, para justificar a longevidade do jogo.

Gimmicks em um jogo que já é entupido de gimmicks, de movimentos “estilosos” que atrapalham a sua mira ou o uso de objetos do cenário para destruir os inimigos – que ao ser pareado com o sistema de movimentação ligeiramente impreciso, causa mais irritação do que diversão, resumindo-se a efeitinhos para lá e para cá para fazer o jogador se sentir o ser mais poderoso do universo.

O que não há nada de errado com isso, se não jogasse toda a experiência que não envolve “ser esse jogador poderoso” no lixo.

No final de cada fase, My Friend Pedro gera um pequeno gif que pode ser salvo ou compartilhado diretamente em sites como o Twitter.

De todos os gifs que eu vi nas minhas partidas no normal ou no hard, nenhum deles estava relacionado às sessões de plataforma — algumas que eu fiz com enorme (e difícil) precisão só para não perder o multiplicador.

Era sempre algum gif novo de mim detonando os inimigos. E essa acaba sendo a maior e melhor condensação do que é My Friend Pedro.

My Friend Pedro vai além de gerar a sensação de poder para o jogador; parece que seu objetivo é permitir ao jogador compartilhar esse “poder” com outras pessoas ao redor do mundo por meio do simples clique de um botão.

Puff, e lá está a imagem postada no seu Twitter, salva em seu computador. Aquele momento único, eternizado (até que o próximo jogo famoso saia), compartilhado, divulgado. Propaganda gratuita para a Deadtoast e para a Devolver Digital.

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…e acabam levando toda a “experiência” para baixo.

Muitos jogos possuem essa função, e eu particularmente tendo a não ver problema com ela, mas com My Friend Pedro é diferente.

Naveguei pelas dezenas, centenas de gifs que criei enquanto jogava e a história era a mesma: uma cena de ação que certamente faria alguém abrir os olhos e dizer “uau”. Me sentia como se navegasse por um mural de fotos do Instagram com histórias contadas sem contexto, sem pano de fundo, demonstradas como a única verdade existente, escondendo o lado “feio” das coisas.

Esconder, isso My Friend Pedro faz muito bem. Esconder “vergonhosamente” as suas origens ao adicionar mecânicas supérfluas, uma história rasa; esconder que algum dia ele foi algo que para os olhos da indústria de jogos pode ser considerado inútil. Ele sonha em não ser descartável, mas acaba se tornando mais insignificante que a sua versão original.

My Friend Pedro: Conclusão

Para My Friend Pedro, ser “gente grande”, ser reconhecido pela indústria de jogos significa fazer de tudo um pouco, mesmo que esse pouco não sirva para muita coisa — pois é isso que “gente grande” faz.

Com essa mentalidade, ele não só esquece as suas origens, como transforma um jogo que devia ser divertido e leve em algo moderadamente frustrante.

Nem todo jogo precisa passar uma mensagem, ter uma história, ter personagens desenvolvidos. Às vezes, tudo que basta é uma arma e alguns capangas.

(Por Lucas Moura, editor do HU3BR)

Leia mais textos como este sobre games, fora do mainstream e dos holofotes, no HU3BR.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.

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