O filme Alfa (Alpha, 2018) despertou minha curiosidade especialmente por tratar-se de uma época onde os seres humanos estavam nos primórdios, há 20 mil anos atrás.
Como é dirigido e tem a história criada por Albert Hughes,conhecido por bons filmes como “O Livro de Eli” e “Do Inferno”, aparentemente o filme apresentaria algo muito interessante e até educativo em relação a quem éramos e sobre nossas origens.
Ledo engado. Ao invés de retratar a jornada da sobrevivência de um habitante da antiguidade, o filme pende para o romântico, o bonitinho e o fofo. E se torna um completo desastre do ponto de vista histórico.
A fotografia, efeitos especiais e visual maravilhoso deste filme não consegue segurar as muitas escorregadas que a história proporciona – o que tira totalmente a imersão e o realismo da história. Constantemente me vi pensando: “O quê? Sério que nessa época era assim?”. E abaixo você entenderá o porquê.
Aviso: A partir daqui o texto contém spoilers
Os habitantes de Alfa são descritos como pessoas que viviam na Europa, há 20 mil anos. No entanto, o filme os retrata como uma espécie de derivação de Índios Nativos-Americanos, ou muito parecido com eles. Na realidade, os habitantes das partes geladas da Europa naquela época eram negros.
No início do filme, antes da caçada, o personagem principal do filme (o menino Keda) leva uma surra para adquirir mais “força” ou ser mais “duro”. É extremamente difícil de acreditar que isso acontecia, levando em conta que todo mundo naquela época naturalmente era mais duro pelas condições de vida existentes por ali. Porque as pessoas dariam uma surra e possivelmente causariam danos para vida toda, ou algum dano fatal a um jovem – que serviria como um recurso crucial para a sobrevivência da tribo dali para frente, de graça?
Abraços, lágrimas, choros, gritos. Todo o sentimentalismo que estamos acostumados nos dias de hoje são retratados com maestria neste filme. Há 20 mil anos, a expectativa de vida era horrivelmente mais baixa. Dificilmente as pessoas passavam dos 30, 40 anos. Logo, a morte era algo recorrente. Nesta história, no entanto, há um sofrimento exacerbado em torno do tema, sem falar em momentos “bonitos” embalados por músicas emocionantes.
Keda não consegue de forma alguma produzir fogo, sendo que ele é um jovem de cerca de 14 a 16 anos. Algo essencial para a sobrevivência naquela época, e que normalmente seria ensinado desde criança. Mesmo sendo um personagem extremamente fraco, ele consegue sobreviver à vários perigos iminentes e inclusive sabe colocar o osso do pé no lugar quando precisou. Mas ainda não sabia como fazer fogo. Vai entender…
À beira da morte, o garoto e o seu companheiro logo encontram uma tenda no meio da nevasca, com um homem sentado e morto na frente da barraca. Ao procurar comida lá dentro, não encontra nada. Eis que o filme “segue em frente”, sem qualquer ação do personagem em relação a se alimentar. Há 20 mil anos atrás, e especialmente em companhia de um lobo, o mínimo que aconteceria seria se alimentar da carne humana do homem que vivia na tenda. Ali, não era uma questão de escolha. Era viver ou morrer.
Calças foram inventadas quando os cavalos foram montados pela primeira vez – muitos, muitos milhares de anos depois. Na realidade, é mais provável que tenham sido peles largas e tenham gordura na pele. Sem falar naquele maravilhoso cachecol que o personagem usa – tão necessário num inverno frio.
O protagonista passa por tantos perrengues que não existiria chance alguma de sobrevivência, a não ser em um filme totalmente fantasioso e inverídico como este. Foram vários indícios de morte certa, como por exemplo quando rompe o gelo do chão e ele cai na água fria – e depois dorme ao relento no meio de uma nevasca, totalmente nu. Ou depois que ele tosse sangue e revela uma doença grave nos pulmões, e mesmo assim consegue sobreviver sem qualquer tipo de tratamento ou medicina como nos tempos atuais.
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